Eu tinha dezessete anos. Eu era atleta e isso era minha vida. Nunca tinha pensado em outra coisa. Eu colecionava fotos, mas eram fotos de atletismo. Aí um dia veio um pôster, um desses bem grandes. Você desdobra uma vez, duas. E era aquela foto da menina afegã, tirada pelo Steve McCurry. Eu acho que fiquei mais de quinze minutos olhando a foto, sem parar. Eu achei aquilo maravilhoso. Eu olhava cada detalhe. E só conseguia pensar: é isso. É isso o que quero fazer. E então fui estudar fotografia e me tornei fotógrafa.
quarta-feira, 10 de junho de 2015
terça-feira, 9 de junho de 2015
Morte em dois atos
Primeiro morreu a lanchonete. A lanchonete que tinha os banquinhos antigos ainda, aqueles redondos que ficam sobre tubos de metal, em frente ao balcão. A lanchonete que tinha uma televisão antiga, de tubo de raios catódicos, mostrando vídeos o dia inteiro. Vídeos de aviões. Ficava de frente para o pátio. Pelas janelas largas entreva o sol e saiam olhares apaixonados. Os velhos frequentadores tinham sempre muitas histórias e sorrisos. As paredes eram forradas de quadros colecionados ao longo de décadas. Ilustrações. Frases, brincadeiras, presentes. Tudo isso foi derrubado. Daria lugar a um novo bar. Uma franquia. Móveis modernos. Design oriundo da mente estudada de um arquiteto. Otimização do fluxo de pessoas. Maximização dos lucros e modernas estratégias de marketing. O antigo dono, ao que eu soube, durou pouco mais de um ano. Adoeceu. Desistiu de viver. Rendeu-se ao roubo legalizado de que fora vítima.
Seja louco
O mundo precisa de pessoas diferentes. Precisa desesperadamente. As praças precisam de artistas que chamem a atenção. As rodas de amigos, nos clubes e bares, precisam de assunto, de pessoas exóticas a quem admirar ou criticar. Os livros precisam de autores loucos, que perturbem a crítica divindindo-a entre apaixonados e odiadores. Não deixe o mundo indiferente a você. A indiferença é a morte.
segunda-feira, 8 de junho de 2015
Adeus mundo!
Descobri que não sou necessário. Descobri que posso morrer de repente. Vítima de um crime, de um acidente, ou de um equívoco das batidas do coração. E o mundo seguiria seu curso. O aquecimento global, os trabalhadores voluntários, o preço do pastel. A morte injusta dos pinguins, os xingamentos de trânsito, as denúncias de corrupção. Tudo isso seguiria em frente. E então qual a razão de eu me preocupar em permanecer vivo?
Não me entendam mal. Para a alegria de uns e tristeza de outros, afirmo categoricamente: não estou pensando em suicídio.
Estou, isso sim, pensando na necessidade de viver "como se deve". Assistindo tais e tais programas de TV. Tendo esta e aquela rotina. Sendo a pessoa que devo ser.
Estou, de outro modo, descobrindo a liberdade de existir de outros modos. De um modo que não condiz com as expectativas pouco criativas com que a sociedade nos olha. Casamento. Filhos. Casa própria. Carro na garagem. Terno e gravata nos dias de semana.
Adeus mundo!
domingo, 7 de junho de 2015
Ainda sobre procrastinar
Salvei os links, todas as abas aqui no meu navegador.
Depois eu leio.
Ode à procrastinação
Grande Deusa, poderosa,
Se impõe impiedosa,
Evitando que mediocres idiotas desenvolvam suas estúpidas idéias,
Como, por exemplo,
sábado, 6 de junho de 2015
Lembranças
Os ares se dividiam em silêncios e lamentos. Risadas e repreensões. Barulhos de botas amassando o chão. Quem deixou o trator no lugar errado? Por que a janta ainda não está pronta? Um boi escapou, vamos lá buscá-lo. Urgências. E eu, criança, achando tudo aquilo uma atração encantadora, sem fazer idéia de que era apenas uma vida sofrida, uma existência privada de outras escolhas.
Lado A e Lado B
E há também a escrita de dentro para fora. Que é a escrita-exorcismo. A escrita-auto-psicográfica. A escrita-terapia. A escrita-exploração-de-si. Esta não precisa ser inteligível. Não precisa voltar jamais a ser lida, nem mesmo pelo autor. Sua função é a de estruturar e acalmar pensamentos. Dar voz e estruturas a coisas perdidas lá dentro. Muitos filósofos e sociólogos publicaram textos escritos dessa forma, por não entender esta distinção.
E não é uma diferença óbvia. Não se trata da diferença entre um diário e uma matéria de jornal. Trata-se uma diferença no modo de escrever. Um texto aparentemente jornalístico pode pertencer à segunda categoria, ao passo que uma escrita em diário, devidamente bem estruturada, pode pertencer à primeira. A diferenciação está no modo de escrever. No modo de conceber, ou não, um leitor do outro lado. E sentir empatia por este leitor, ainda que ele seja no momento um completo desconhecido.
sexta-feira, 5 de junho de 2015
Parará-Tim-Bum!
-Tem que aproveitar... não é todo dia, não é?
Eles apenas riem. Ambos.
A polícia podia ser sempre assim.
Os outros
Que loucura, que loucura! Faço com freqüência a prática da escrita livre. Mas as coisas que pensamos livremente... essas são difíceis de contar a quem quer que seja!
quinta-feira, 4 de junho de 2015
Fotografia
Propriedades
quarta-feira, 3 de junho de 2015
Arqueologia da ficção
Stephen King, goste você dele ou não, defende uma imagem bem interessante para a criação de histórias em seu livro "Sobre a Escrita", que é exatamente sobre isso aí que você leu. Ele defende que a criação de história é uma espécie de arqueologia telepática. A história, de certa forma, já está pronta em algum lugar, e o trabalho do escritor é desenterrar essa história, com cuidado, limpando delicadamente o véu de areia e poeira que a esconde do mundo. O interessante dessa imagem é a separação aparente entre escritor e criador. Uma vez que se tenha partido da idéia inicial, parecem existir trilhos levando a história para o próximo evento. Isso não é, estritamente falando, verdade. Mas, em termos de postura psicológica, de estado mental em que o escritor deve imergir durante o processo de parto da história, é uma imagem verdadeiramente bela.
Medo de amar
Desafio do dia
terça-feira, 2 de junho de 2015
Desculpa muito
Desculpo seu china, desculpo. Mas puxei assunto. Queria saber coisas.
-Há quanto tempo está no Brasil?
-Oito anos.
-E como foi no começo? Como você pensava que era aqui?
-Primeiro falaram muito perigoso. Brasil muito perigoso. Roubo, muito roubo. E primeiro não ficou aqui. Primeiro lá vinte e cinco, sabe? Lá mais bagunça. E dia que chega Brasil, pára na rua, e vem moto do lado. Mas eu não sabia. Tinha moto e motor fazia bum! bum! bum! Eu pensava era tiro. Muito medo.
Poxa seu china... Desculpa... desculpa muito!
Aprender a olhar
Depois, com a prática, vai se acostumando, até por fim se habituar a buscar coisas belas ao redor mesmo sem ter a máquina fotográfica nas mãos.
segunda-feira, 1 de junho de 2015
A crítica literária
"Eula-Beulah era dada a peidos - daqueles barulhentos e fedidos. Às vezes, quando estava atacada, ela me jogava no sofá, coava a bunda coberta por uma saia de lã na minha cara e mandava ver.
-Pou! -Gritava ela, se divertindo.
Era como ser soterrado por fogos de artifício de metano. Eu me lembro da escuridão, da sensação de estar sufocando, e me lembro de gargalhar. Porque, embora aquilo fosse, de certa forma, horrível, também era, de alguma forma, engraçado. De várias maneiras, Eula-Beulah estava me preparando para a crítica literária."
Dos desprezos
Quando se despreza um tirano distante, tem-se um excesso de empatia por aqueles que sofrem sob suas garras.
E quando se despreza a experiência alheia, por puro descompasso com a estética própria, tem-se uma ausência de empatia para com a alegria do outro.