A rua é opressiva, perigosa. O frio da noite. A gente reclama do calor de São Paulo. A gente xinga as paredes das nossas casas, dos nossos apartamentos. "Elas retém tanto calor!". Não imaginamos o frio que ainda ocorre nas noites paulistanas. Não é fácil ser um mendigo por essas bandas. Dormir num papelão. Arranjar trapos velhos de cobertor. Por um bom tempo eu via apenas a física do problema: eu via um mendigo dormindo com um cachorro e pensava "está um aquecendo o outro".
Há um outro efeito também, que eu ignorava por completo. Lá no bairro morreu um mendigo, e o seu Rubens tentou cuidar do cachorro. Era conhecido de todos já, então não iríamos deixá-lo na rua, abandonado sem seu antigo dono. Não teve jeito. O vira-lata desesperou-se ao ver preso no conforto de uma varanda com comida garantia. Queria a rua. E aí percebi essa troca fundamental. Além do calor do corpo nas noites frias, o cachorro é fundamental para dar ao mendigo esse amor feliz pelas ruas. Algo impossível de um ser humano ter por si só. Sua função maior é aquecer a alma em nossos dias frios.
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