quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Diferentes

Terminei com ela. Terminei porque eu não aguentava mais a falta de humor da vida dela, a falta de brilho na experimentação das pequenas coisas. Terminei com ela porque ela era perfeita demais de um jeito que para mim beirava o artificial. Eu não a sentia orgânica demais. Ela me parecia simplesmente bem sucedida demais na tarefa de encaixar a vida em esquadros. Irônico ser eu engenheiro e ela ter feito Letras, não acha?

Ou será uma falha minha? Ou será que estou escondendo meus defeitos? Tantas são as infantilidades que tenho que se chocavam de frente com o jeito dela, que tive que esconder de imediato para que a relação, para início de conversa, pudesse ter começado! Minha completa falta de disciplina com o cotidiano. Minha aleatoriedade total no planejamento e execução da minha vida até aqui. Meu jeito de não saber o que vai acontecer nas próximas semanas. Minha mania de não me importar com o calendário das pessoas ao meu redor. Eu não sei quais são os próximos aniversários. Não sei quais viagens estão sendo combinadas. Eu não sei o que está se passando e não me importo. Estou mergulhado num grande agora, e agora o que faço é escrever à noite. Quando estiver em um outro agora, em que as pessoas estejam se telefonando para ir viajar, então vejo se faço minhas malas ou não. Não há o que pensar antes disso. Dinheiro, irresponsabilidade com o dinheiro. Talvez eu tenha mais de três mil reais nas minhas prateleiras só em livros ainda não lidos, sem contar um outro tanto que acabei lendo às custas de um tempo que comi das minhas aulas na faculdade, de meus compromissos com a família, enfim.

A liberdade de ser eu mesmo não deve implicar numa total falta de necessidade de melhorar. Tenho que melhorar. Tenho meus pontos. Mas terminei com ela. Terminei com ela porque a gente não sorria. De início, ela me fez sentir um total desespero por colocar minha vida mais nos trilhos para que eu ficasse à altura dela, para que eu pudesse merecê-la e tê-la. Depois, com a maior aproximação, apenas passei a sentir uma desvontade completa por essas melhoras: para ter uma vida tão sem graça, simplesmente não valeria a pena mudar tanto.

Estou viciado no caos da minha vida? Estou viciado na ludicidade da minha desorganização?

- Vocês têm muito a acrescentar um ao outro ainda, se conseguirem passar por cima dessas barreiras!

As pessoas são diferentes, são diferentes! Eu não preciso me ajustar a ela, afinal. Se está tão difícil encontrar felicidade ao lado dela, devo deixá-la livre para procurar no mundo algo de que ela realmente goste, e eu procurarei no mundo algo que eu gosto!

Se eu estivesse com a Sá ainda, e tivesse feito o que fiz hoje, dado um brinquedo de presente pro filho recém nascido da Mi, e mais cinquenta reais em dinheiro pra própria mãe, o que teria acontecido? Uma crise de ciúmes, críticas sobre como sou capaz de gastar um dinheiro que não tenho comprando um presente para uma mera amiga enquanto me recuso a gastar o mesmo dinheiro com a gente, com um motel hoje ou com um passeio ou simplesmente economizando porque, afinal, é um dinheiro que não tenho.

Isso é meu jeito apenas, ou são meus erros? Não sei o que a sabedoria dos antigos diriam a respeito, agora me foge o humor com que os comediantes emoldurariam essas verdades... Só sei que é o que estou vivendo. Terminei com ela, mas a esperança é que eu venha a reatar comigo.

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