Eu era um estranho chegando ali. Mas o Fera, a quem eu nem havia sido apresentado ainda, pulava alegre como se chegasse um velho amigo. Um cobertor e duas blusas. É o que eu tinha. Falei do frio. Entreguei o cobertor e as blusas ao Rafael. E o Fera pulava e pulava, feliz.
Tinham um canto na calçada. Não os expulsavam dali porque estavam em frente a um estabelecimento abandonado. Tempos de crise. E, naquele canto escuro, não eram uma presença marcante o suficiente para espantar a clientela da farmácia ao lado.
Mas o Fera não sabia de nada disso. Seus pulsos, giros, rabo abanando, eram indistinguíveis de qualquer outra realidade mais afortunada.
- Esse aqui é o Fera… Fica junto comigo até nessa friaca doida!
Rafael dobrou as blusas com o esmero de um alfaiate de alta costura. Mais uma vez, agradeceu. E ficaram ali, ele e o Fera. Sorrindo e brincando um com o outro.
Despedi-me e fui embora, aquecido.