terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Suzi

As leituras de livros profundos desperta em mim um sentimento de amplidão contrariado pelas limitações cúbicas deste quarto. Penso na barba mal feita do meu pai quando o vi. Penso no filósofo palestrante sugerindo que eu solte minha raiva dos meus velhos traumas. A atenção dos meus pais? Os namoros que deram errado? A cachorrinha que morreu? Suzi, pobre Suzi. Viveu tantos anos. Eu tinha esse sentimento profundo de amizade por ela. Dos membros da família era o que mais me compreendia. Eu jogado no chão da sala com um livro no colo e ela se aproximava. Apoiava a cabeça na minha perna e ali ficava. Com o tempo, comovido com tanta atenção, desatei a falar. Contava para a Suzi o que tinha acontecido comigo. Falava para ela do meu dia. Meus problemas na escola. Minhas dúvidas sobre o futuro. Os livros interessantes que eu havia lido. A Suzi ali, me olhando com um profundo desespero de quem gostaria muito de entender todas aquelas palavras. Nessa devota vontade de compreensão era como se, efetivamente, ela as entendesse.

A barba mal feita do meu pai. Por que pensei nisso? Medo, tenho medo de me tornar como ele. Esse abandono de si. Esse sentimento de que no fim das contas as coisas não se ajeitaram como deveriam. Eu tinha a Suzi para me ouvir. Quem meu pai tem? Fui socorrê-lo achando que estava tendo acessos suicidas e fiquei com raiva por julgá-lo um velho fracassado que havia desistido de tudo. Depois vi que não era nada disso e fiquei tomado de raiva por achá-lo um velho fresco que reclama demais quando está tudo bem na verdade. Eu vou socorrê-lo. Dirijo as centenas de quilômetros, à noite, sem saber se o encontrarei vivo ou desistido de si, só para dormir ao lado dele e dizer que vai ficar tudo bem. Quem vem aqui dormir do meu lado para me dizer que vai ficar tudo bem? Suzi, onde está a Suzi?

O mundo desistiu de me tranquilizar. Lia sobre a conquista espacial e as descobertas científicas, o controle do átomo, a manipulação do DNA, e achava que iria ficar tudo bem. Ainda que minha vida tivesse lá seus tropeços, no fundo no fundo ficaria tudo bem. Talvez não comigo mas ao menos com a humanidade como um todo. E assim qualquer excesso de dor que eu tivesse com relação à minha própria vida seria um egoísmo a ser vencido. Mas agora o Trump ganhou. O Brasil foi tomado por ladrões. A Síria foi devastada. Tudo bem que nunca paramos de destruir países e fabricar famintos e mortos de todas as idades. Mas quando perdem o pudor de fazer isso com uma nação que estava inteirinha então uma nova barreira foi rompida. Não são os mesmos mortos de sempre. E a comoção não atinge os níveis devidos.

A leitura de livros profundos me desconecta desse instante. Já foi uma desconexão boa. Sentir pertencer aos milênios. A uma espécie que evoluiu para criar a escrita, a poesia e dominar o aço e o elétron. Mas agora esses livros todos, e a internet, e tudo o mais, me mostra que estamos jogando tudo no lixo. É noite e temo pelo pior. Mas não sei para onde dirigir. Não sei a quem ajudar. Suzi, cadê você?

sábado, 17 de dezembro de 2016

José Alfredo

Nasceu em uma cidade de Goiás cujo nome não interessa a ninguém. De pequeno fez como o pai: carregou coisas. Coisas para dentro da Kombi, coisas para fora a Kombi. Achava a televisão uma coisa maravilhosa mas dormia rapidamente depois da janta. Exaustão. Mudou-se de cidade quando os negócios escassearam por ali. Já havia viajado com seu pai em mudanças para locais mais longe e sabia que existiam outras possibilidades. Aprendeu a sobrepor tijolos, cimentos, tijolos, cimentos. Emparedou a vida alheia tentando dar asas à sua. Casou-se com a bênção da igreja e a desconfiança de parentes que não achavam direito Deus autorizar essa mistura com as gentes pretas. Colocou os filhos na escola sob protestos dos mesmos. “A vovó falou que você ia trabalhar com o vovô… quero ir trabalhar com você, não quero ir à escola!”. Viu muitos amigos fraquejarem diante da vida. Bebidas. Crimes mais leves, mais pesados. Injustiças. Mas manteve seu rumo. Navegou pela vida em direção a tardes de cadeira de balanço e sopas de mandioquinha trazidas pelo filho. Aos fins de tarde costumava sentar-se à calçada para apreciar o por do sol e comentar com um ou outro que por ali passavam: “Ói lá Deus levando o Sol embora. Amanhã ele traz de novo. Eita serviço que não acaba nunca.”

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

E seu pai?

Meu pai andou carpindo uma horta lá... fez bolhas nas mãos mas sumiu algumas bolhas da alma.

Fofocas de WhatsApp

Um ator nu com sua esposa. Um aluno da escola passando por uma situação constrangedora por ter tido uma diarreia em momento altamente inconveniente. E, em instantes, essas coisas ganham o bairro. A cidade. O estado. O país. Outros lugares do mundo inclusive. O milagre da internet.
A tecnologia serve para potencializar o que é humano. E não somos criaturas compartimentadas. Em nossa alma o bem habita não apenas lado a lado com o mal. Estão misturados. São duas fragrâncias oriundas do mesmo líquido. Nossa inocência está misturada com nossa malícia. Nossa vontade de honrar misturada à nossa tentação de sacanear.
Graças à internet nossos lapsos explodem por toda parte em segundos. A humanidade que havia se tornado um gigante lar de anônimos voltou a ser o vilarejo das fofocas.

Era uma casa muito engraçada

- A casa ainda está alugada?
- Ainda.
- E por que? Você está indo lá?
- Não... O plano deu errado.
- Que pena. Achei que você estivesse mais lá do que aqui.
- Não. Banquei o aluguel de uma casa vazia. Fico pensando no que isso pode significar.
- Significa que está jogando dinheiro fora.
- Não só isso. Mas tenho pago por espaços vazios. Preciso começar a valorizar os espaços cheios.

Funcionou

Pelo visto a questão com o OLW, Open Live Writer, é que de tempos em tempos é necessário deletar a conta e criá-la de novo, ao menos no caso dos serviços do blogger, para que os servidores do Google liberem uma nova senha de acesso. Afinal eu não tenho mais que digitar minha própria senha no cadastro do blog. O OLW acessa os servidores do google e solicita um acesso. Bom… exceso de tecnicidades à parte, fico contente que tenha funcionado.