quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Sour times

Eu adoro ouvir Portishead... Especialmente de madrugada. Especialmente em madrugadas chuvosas, como essa... E deixo rolar, deixo tocando. Ainda bem que estou sozinho em casa, faz um bem danado a essa música. Ainda tem os copos de vinho espalhados pela sala, mas já foram todos embora. E estou no limiar de uma ressaca. Tudo, tudo para tornar a música perfeita.

Me jogo sobre o sofá mas entendo que não combina... Vai rolando Strangers, It could be sweet, e eu entendo que o sofá ofende a música... Vou para o chão, fico sentado num canto, olhando a penumbra da luz da rua invadindo a sala e um ou outro flash de relâmpago brilhando em tudo. Perfeito, perfeito!

domingo, 18 de dezembro de 2011

Saudade cortando...

Eu queria tanto te ligar agora. Sabe o assunto? Qualquer coisa. Qualquer coisa. Você está aqui do lado e está longe. Um oceano era menos. Éramos mais perto. Agora não há oceano. Poucos quarteirões. Um logo ali. Mas entre duas vidas que divergem de repente há todo um mundo. Nos falamos tão pouco. Você sente saudade? Sente uma saudade desse tamanho todo? Lembro daquela vez que conversamos noite adentro em assuntos desembestados, sem rumo. Sabe o que pensei? Que eu poderia envelhecer ao seu lado e seria um prazer enorme. Tive uma certeza quase cruel de tão inegável sobre a natureza do que sinto. Maldita. Antes fosse mais fácil esquecer você. Parece um erro tão grande, agora, eu tentar esconder o que sinto. Não é mesmo? Mas o que vou fazer, afinal? O que vou fazer se não sou, e sei disso, a pessoa com todos os predicados que você procura? Não tenho o emprego, a formação, o status que você procura. Queria apenas ignorar essas dores todas de te ver partir para ser mais fácil me fazer presente vez ou outra. Continuar mentindo a você sobre nossa amizade. Você ficaria brava se descobrisse essa mentira? Uma mentira de assim tantos anos... Seria perdoável? Seria compreensível? Uma das coisas que você mais odeia é a mentira, não é? E essa? O que dizer dessa mentira?

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Ah, os ciclos da vida...

"Chorar é semear
Rir é colher"

Obrigado, Maharal!

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Das notícias

E aí eu senti as coisas mais em ordem no meu mundo. Me senti bem. É quase um egoísmo, essa felicidade pelos outros que me importam tanto assim.

domingo, 18 de setembro de 2011

Contas

Mergulho nas bibliografias de tantas outras vidas. A pobreza, o trânsito, o meio-ambiente, a felicidade econômica, a felicidade subjetiva. Uma vida dedicada a entender o mundo? Meu tempo se vai indo e não consigo me comover por posses além das minhas humildezas. Sem carro nem casa nem isso nem aquilo, sou de repente um baita de um infeliz que teima em ser feliz e não consegue outra coisa além de continuar curiosando assuntos por aí. Há muito mais que fazer na vida além de ficar tentando ganhar dinheiro, não é mesmo? E um dia cairei morto num canto. Que terá ficado? Muito cedo para pensar nisso? Muito tarde para desapegar das ambições rasteiras que insistem em apurrinhar essa e aquela comparação? Os amigos se vão todos sendo levados para uma outra classe social, desejo-lhes boa viagem.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Mi menor


Sinto a música como não a sentia antes. Sinto a música entrando nos menores capilares, trepidando os nervos de dentro pra fora. Não, não foi a Jacqueline DuPre que mudou. É uma gravação. A mesma gravação de dez anos atrás. Dez anos! E, hoje, é como se eu nunca houvesse ouvido essas músicas antes. Uma completa novidade. Os violinos de fundo. As singelas percursões em um ou outro ponto, nada mais. Uma batida de tímpano, bem ali, ouviu? A orquestra toda. Escuto, escuto a música em meu quarto escuro, pequeno, seco e empoeirado. Mas estou longe daqui como nunca estive. Escuto apenas e nada mais. Mas, pela música, vejo cada instrumento e instrumentista bem diante de mim, três dimensões, realidade virtual, realidade completa. Estou encantado.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Sociedade hipócrita

Existem hoje em dia diplomas para aqueles que desejam explorar sem escrúpulos nem piedade justamente os que mais precisam de ajuda. Os diplomas vêm, é claro, com títulos acima de qualquer suspeita: médico, psicólogo...

Bairro aqui já na periferia... Telefonei... R$150,00 A CONSULTA com um psicólogo.

A CONSULTA!

Se esse cretino fizer três consultas por dia... ou seja, sentar a bunda escrota dele naquela poltrona idiota para ouvir o sofrimento alheio por míseras três horas... Vai embolsar 450 reais! Arredondando para 23 dias de trabalho no mês, isso dá um salário de 10300! Ah, os custos da clínica, claro, claro... Tiremos 2000 de aluguel+luz+etc e mais uns 800 pra mocinha da recepção... Sobrou só 7550 pra esse crápula.

Vamos lá... Vamos a uma versão mais atual e pertinente do juramento de Hipócrates... Juramento que todos os médicos atualmente recitam ao se formarem, ainda que apenas em seu íntimo:

Eu juro, por Apolo, médico, por Esculápio, Higeia e Panaceia, e tomo por testemunhas todos os deuses e todas as deusas, cumprir, segundo meu poder e minha razão, mediante pagamento que me apeteça os instintos, a promessa que se segue: estimar, tanto quanto a meus pais, aquele que me ensinou esta arte; fazer vida comum e, se necessário for, com ele partilhar meus bens, desde que antes ele partilhe comigo os seus; ter seus filhos por meus próprios irmãos, de quem posso demandar heranças em momento oportuno; ensinar-lhes esta arte porém não permitir que a usem contra mim, se eles tiverem necessidade de aprendê-la, e com remuneração e sempre com compromisso escrito; fazer participar dos preceitos, das lições e de todo o resto do ensino, meus filhos, os de meu mestre e os discípulos inscritos segundo os regulamentos da profissão, porém, só a estes.

Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder, entendimento e benefício, nunca me responsabilizando por causar dano ou mal a alguém. A ninguém darei de graça, por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda. Do mesmo modo não darei a nenhuma mulher uma substância abortiva às vistas da lei.

Conservarei imaculada minha vida e minha arte.

Não praticarei a talha, mesmo sobre um calculoso confirmado; deixarei essa operação aos práticos que disso cuidam, a fim de evitar responsabilidades desnecessárias.
Em toda a casa, aí entrarei para o bem dos doentes, mantendo-me longe de todo o voluntário que ouse ajudá-los sem demandar justo honorário, e de toda a sedução sobretudo longe dos prazeres do amor, com as mulheres ou com os homens livres ou escravizados.

Àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar para justificar meu lucro, eu conservarei inteiramente secreto.

Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Amém

"Deus escreve certo por madrugadas tortas."

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Quebrando as pernas

- Eu sei que o nosso namoro não é para sepre, mas o que eu sinto é...

sábado, 9 de julho de 2011

Indo embora

Conversar comigo mesmo, é isso que quero. Mas não, não me dou ouvidos no momento. Está tudo se bagunçando, uma entropia irresistivelmente almentando, inflando meus sonhos gigantes expansivamente pra longe, longe e longe, e onde é que eu fico no meio de tudo isso? Vem aqui aquela lembrança da voz doce, do olhar delicado emoldurado pelo sorriso mais leve e penetrante que já vi. E a lembrança se eteriza eternamente entrando num pra sempre até jamais.

domingo, 3 de julho de 2011

Os sonhos nas garrafas

Clarissa estava atordoada com a vida. Decidiu, para acalmar-se, engarrafar seus sonhos e anseios. Assim o fez. Sentou-se então em sua poltrona e ficou a mirar a estante. Garrafinhas várias brilhando ali suas imaginações e sonhos dos mais desconexos. Percebeu que seria impossível organizar a estante de uma maneira coerente, incoerentes entre si que são as coisas que queremos. Enciumada e narcisística, afugentava a todos que ameaçavam se aproximar. Passou a evitar visitas. E se alguém derruba uma garrafa e a quebra? Impensável.

Anos se passaram e Clarissa morreu em sua poltrona. Seus sonhos permanecem intactos como da primeira vez em que foram sonhados. Pelos vidrinhos transparentes, iluminam o corpo de Clarissa que, feliz, apodrece ali, velando a existência que nunca aconteceu.

sábado, 25 de junho de 2011

O plano

Não, o plano não era o de criar um segredo assim tão intrincado e delicado. O plano consistia em mudar a própria realidade, fazer com que uma mentira se tornasse uma verdade. Quis viver em um outro mundo. Falhou. Só tem esse. Minha mentira é, ainda hoje oito anos depois, uma mentira. A verdade ainda é algo com a qual não sei viver em paz.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Heterônimo no divã

Às vezes é extremamente difícil estabelecer contato com alguém.

Especialmente quando você, pripriamente dito, não existe.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Saudades diferentes


Estava lendo aí um blog próximo e tive como surpresa a visão do grau de saudade desmedida que a pessoa sentia de si mesma. Vai um pequeno trecho, com o perdão de qualquer indiscrição:

"Estou mais calada e pensativa do que de costume. Só consigo ficar ouvindo música, lendo... o silêncio e o não fazer nada me incomodam. Tenho sono quando eles acontecem..."

Mais calada do que de costume. Calada para si? Calada para os outros? Ambos?

Certas respostas nos faltam e por vezes vira uma falta de ar danada essa procura por respostas. O sentido de nossas ações, acerto de nossas escolhsa, importância para o mundo...

Há, penso, alguma sabedoria por trás dessas doutrinas que insistem numa espécie de desligar. Quando a pergunta é perturbadora demais e mostra-se um beco sem saída pode ser prudente pertuntar-se também se o primeiro questionamento é válido. Podemos mudar nossos humores, e efetivamente o fazemos o tempo todo sem nos darmos conta.

Alguns criticam uma visão excessivamente materialista do mundo por ser fria e calculista demais... Um universo sem criador, sem objetivo, uma existência sem razão. Para mim não há nada mais libertador e romântico. Sabendo que o sentido e a liberdade está em nós mesmos a felicidade mostra-se por fim mas próxima, não mais distante e impossível.

Dia desses eu me desesperei. Precisava loucamente viajar. Ásia europa ou eua, tanto faz. Fozzo pronde fosse, eu precisava viajar. Sair daqui pra longe deixando para trás minha vida toda, minhas angústias todas, meus anseios todos.

A caminhada foi muitíssimo mais modesta, no fim das contas. Caminhei lá pelo parque Tuiuti, Tatuapé. Não teve aeromoça, não paguei Albergue. Mas no desenrolar da tarde observei esse curioso fenômeno. Onde quer que eu fosse, lá dentro do parque, buscar meu sossego, eu ia junto. Entende? Eu e meus desassossegos: indissociáveis. Percebi que se eu fosse para o Himalaia invariavelmente levaria também esse mundo de questões pesadas comigo e só havia uma saída: livrar-me delas aqui mesmo. Feito isso, não precisava mais viajar. A paz estava de repente em todo lugar!

sábado, 18 de junho de 2011

Dia-a-dia

Emputeci assim que li a mensagem. Birra, criancice. "Ainda bem que perguntei. Ninguém vai ter tempo pra aparecer, nem meu namorado". Birra. Ligue e diga que quer que eu apareça. Tente entender porque eu disse que não iria. Fiquei furioso. Não com a tristeza ou com a carência dela, mas com a atitude. Minha fúria seria uma face trepidante de minha falta de amor? Não importava. As coisas não se misturavam. Estava emputecido e pronto. Liguei. Caixa-postal. Liguei de novo. Outra vez. Várias. Desligado. Maldita. Fui até lá. Ao abrir a porta e ver uma fúria em meus olhos que não sei medir aqui, chorou, tremeu. Arrependimento. E eu, quem disse que eu sabia lidar com isso? Não sei se estou cultivando uma fraqueza ou se estou ajudando a superá-la. Quando é que vou saber? Como é que vou saber?

terça-feira, 14 de junho de 2011

Amorologia comparada

Curiosas certas reportagens que estão hoje no G1. Enquanto algumas pessoas apelam para que Santo Antônio lhes arrume um novo amor, há também a notícia de uma jovem que estava procurando algum matador de aluguel a quem pudesse pagar para se livrar do amante. Isso tudo deve dizer algo sobre o amor. Algo a que imploramos com sede divina quando nos falta e que apelamos aos despudores dos infernos quando sobra... Isso deve querer algo. Sobre o amor e sobre nós. Somos hipócritas, para dizer o mínimo. E deus é um descuiodado, por atender vez ou outra a pedidos tão perigosos.

domingo, 12 de junho de 2011

Mares afins

Eu não fui sincero e pagarei por isso o resto da vida. Você poderia ter sabido e aí tomaria sua decisão, esclareceríamos tudo e pronto, caso encerrado. Tive medo de te perder e, ao me esconder, te perdi de mim. Malditas simetrias da vida. Foi culpa do Oceano todo, se enfiando onde não devia? Não... lá longe você estava mais perto; a saudade era mais forte. Aqui, vizinhos de novo, sou mais repulsivo até. sou menos. Sou o mesmo e só. Segue tua vida. Com sorte, ainda te esqueço.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Janaína, querida

Be miserable. Or motivate yourself. Whatever has to be done, it's always
your choice.

Wayne Dyer

Por que é que eu me importo com você? Você cai no choro, eu mergulho na preocupação. Não deveria ser assim, não é? Preciso de uma certa medida de egoísmo que no momento me falta. Me falta mas ainda vou atrás dela. Eu preciso aprender a te mandar pro inferno. De repente você nem vai pra lá, mas subentende-se que ficará autorizada a ir onde quiser, estamos conversados? Eu não posso ser o combustível de seu sorriso. Há algo mais mágico que se pode fazer num relacionamento, que é quando os dois sorriem se abastecendo ao invés de se consumirem. Preciso deixar que em suas lágrimas você consuma a sua paz, não a minha. Só assim talvez você se incomode o suficiente a ponto de pensar em mudar. Pode não acontecer, mas a escolha é sua e eu não posso fazer mais nada a respeito.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Continuum

Não sofro hoje: ecoam sofrimentos do passado.

O futuro não esconde riscos: decido agora onde me enfiar ou não.

Essas ligações todas no tempo, respeitemos, respeitemos!

Que dificuldade patética é essa de ver que os dias se ligam com cabos de aço e se arrastam velozes com a inércia do universo inteiro?

Não confunda com fatalismos, é o contrário disso. Quero que entenda não a irreversibilidade de certas coisas; apenas veja o descompasso dos sofrimentos e espectativas.

Colocamos no presente sofrimentos que melhor viveriam somo receios bem pensados lá no distante passado. Antecipamos no aqui e agora do encher e esvaziar de nossos pulmões alegrias desmedidas que melhor poderiam ficar para depois, sobre alicerces mais firmes. Deveríamos evitar essas distrações e nos concentrarmos no próprio alicerce.

No fundo, somos todos hipócritas esplendorosos. Reclamamos e sofremos infantilmente por um suposto caos incontrolável da vida: doído mesmo é que a vida é determinista demais, não é mesmo? Nossos erros não somem no vento, nossas distrações não tropeçam em sucessos, nossos amores não evaporam em esquecimentos.

Quando eu me acovardar e aceitar algum religiosismo, ao menos saberei que já fomos todos julgados e, acorrentados em nosso livre arbítrio, estamos todos condenados a sermos nós mesmos eternidade afora.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Vou me mudar

Eu quero sair desta casa. Quero sair desta vida. Quero sair do meu emprego. Quero sair do meu namoro. Porque nessas coisas todas há sempre algo que não sou eu. Leio um livro manso sobre o cobertor no meu quarto. Familiares debatem contra a paz dominical os problemas de São Paulo, das ruas. Ótimo, estão debatendo, é saudável! Quero ser errado aqui, serei: saudável uma pinóia. As opiniões são rasas, preconceituosas e desinformadas. E não bastasse toda essa falta de subsídio mental note-se que a prática também é sofrida. São debates mal dialogados. Pergunta-se uma coisa de um lado, questiona-se outra do outro. Toma-se a consideração por ofensa e tudo foi destruído. Existir é tão difícil.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Eu bem que queria

Aconteceu hoje de um acaso trazer desses convites que a gente não quer recusar de jeito nenhum. Uma vaga para morar com ela. Não, não minha namorada, nem minha amante. Uma pessoa que admiro muito e por quem tenho estima. Mas são tantos os impedimentos momentâneos... o custo é maior que meu custo atual de morar aqui sem companhias notáveis. E eu tenho uma namorada, que não veria com bons olhos essa movimentação estranha. A vida tem uns entraves, não é mesmo?

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Alimentos para o corpo e para a alma

O horário de almoço é necessário. Sim, os seres humanos precisam de alimento com uma freqüência considerável, e é próprio de nossa cultura ter o chamado "horário de almoço" compondo as rotinas diárias. Mas vai além. Alimenta-se também a alma. Estão ali todos os ingredientes: reune-se um grande número de pessoas que não necessariamente trabalham nas mesmas atividades. Tem-se um favorecimento à discontração.

Logo as pessoas começam a falar qualquer besteira e a rir. Há coisa melhor que isso? Um monte de gente junta, falando besteira e rindo? Tá, admito. Se fosse por pessoas como eu, talvez a humanidade não tivesse evoluído. Ainda estaríamos todos nas savanas. Mas juntos e rindo. Pior é que não me parece mal negócio...

domingo, 29 de maio de 2011

Manhã de domingo

A manhã de domingo é qualquer coisa lá fora.
Aqui dentro tudo se alterna entre uma segunda que acorda e uma sexta que hiberta.
O que é que há de tão hiptnótico sobre o futuro, afinal? Mania besta de nos distrair do presente.
Somos assim em tudo: pelo imaginário somos capaz de esquecer o real.

sábado, 28 de maio de 2011

Política

Leio um colunista declaradamente direitista extremo, mas ele em geral tem um texto bom e faz boas observações. Parece, acima de tudo, sóbrio. Mas de repente de excede. O mesmo com aquele esquerdista que era tão prazeroso de ler. O que acontece? A resposta vem sugerida nessas linhas de um saudoso historiador:

"uma amiga conta a outra sobre o homem que conheceu, e imediatamente é questionada: 'ele é alto ou baixo?' As chances são altíssimas a favor de que ele não seja nem baixo nem alto. Na média, ele terá uma altura mediana. Mas nos interessa mais esse contraste dos extremos. Nossa mente tem essa teimosa tendência de pender as classificações para os extremos."

É por isso que um belo dia um comentarista muito ponderado vai olhar um novo fato político e vai declarar que é interesse financeiro da classe elevada, ou que é manobra dos petralhas esquerdistas, ou que é manutenção do status de dominância de sei lá quem. Quando a realidade costuma ser muito menos cinematográfica que essas conspirações faraônicas. Na média, a realidade é medíocre.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Importantíssimo



E eu aqui, olha só que coisa, querendo encontrar algo de interessante para centrar minhas atenções e consumir meus tempos. Que bobeira, que bobeira! Ser interessante não é uma propriedade das coisas; é um julgamento nosso. Cabe a nós, no fundo de nossa solidão bem ou mal resolvida, tornar algo interessante ou não. É nossa arte no mundo. Facilita muito a busca saber que procurar lá fora não resolve, não é?

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Num velho diário de dez anos atrás



A Suzi está deitada num travesseiro lá embaixo, perto da minha cama. Estava até agora pouco acompanhando minha concentração no livro "Na Prática a Teoria é Outra", do Joelmir Beting, e agora está um pouco revoltada porque eu a abandonei sozinha lá embaixo e vim aqui escrever. mas ela está cansada demais para subir as escadas e vir ver o que eu estou fazendo. Além do mais, ela está entretida com o som de Dvorák. Tem bom gosto a Suzi...

Estive nestes dias perdido em vários pensamentos sobre meu relacionamento com as pessoas, minhas expectativas com o mundo, minhas exigências e, talvez principalmente, minhas concessões... E a Suzi lá, quietinha, ouvindo Dvorák e esperando que eu apareça para fazer companhia. Talvez seja ela quem me deixa mal acostumado. Fico esperando conhecer alguma pessoa de quem possa ter o mesmo tipo de admiração que a Suzi tem por mim, e a quem possa ser tão inofensivo o meu desprender de uma dedicação e atenção desmedidas. Gosto da Suzi.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Barriga

Moravam juntos. Ambos tinham seus filhos já de vida feita. Dividiriam a vida felizes. Ela engravidou.

- Foi de propósito!

- Não, não foi! Acho que meu anti-depressivo interferiu no anti-concepcional...

Brigaram. Ele a colocou para fora de casa. "Pago a pensão, faço tudo direito. Até crio a criança se ela quiser, só não quero que ela encha mais o saco!"

Perpetua-se a humanidade.

sábado, 21 de maio de 2011

Conflitos

Alguém disse sei lá por quais quandos e ondes, que somos mais propensos a ajudar aqueles que não precisam de nossa ajuda. Essa verdade fere nosso ego, desperta mesmo uma certa ira lá no introvertido como não podia deixar de ser: assim faz a maioria das verdades, afinal! Li também noutros cantos, sobre os vendáveis segredos óbvios da escrita:

"a simples descrição de um personagem não gera interesse, apenas auxilia na criação de uma imagem pessoal. O que realmente desperta interesse ao leitor é o conflito, pois é o conflito que revela a verdadeira natureza de cada personagem. Como cada um reage ao conflito, é isso o que o define!"

Há uma mesma verdade unindo estas duas observações. Ou, alternativamente, essas duas verdades concorrem para definir as verdades em torno de um conflito, num relacionamento. Quando uma pessoa faz da fraqueza sua estratégia de desarmamento num conflito é natural que, ao longo do tempo, desperte no outro nada além da repulsa. Não, não soa bonito, mas é verdade: saber brigar, saber xingar, saber ofender... Essas coisas devem encontrar sua dose na composição da personalidade.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

O livro...

Tão discutindo aí essa coisa de falar certo ou errado...

O novu livro de português vai aqui, numa amostra:> Amostra do Capítulo 1 do livro "Por uma vida melhor".

Eu só num intendo o seguinte... comu é que tantu letrado manjando tantu consegue discutir tantu e opinar tantu sem se dar primeiro ao trabalho de ler o livro! Ficam discutindu nu abstrato, sem ver do que si trata...

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Indignações profissionais



Na mesa ao lado está o Zé, técnico em eletrônica, a desabafar:

- Já levei meu carro várias vezes lá, troquei tudo, agora vai passar na inspeção... Os índices de emissão na marcha lenta tavam altos, troquei tudo tudo tudo. Carro véio é uma bosta. Mas pior que carro véio, mesmo, é mulher velha. A minha agora deu pra reclamar que gastei demais com o carro e que deveria ter procurado um lugar mais barato. Eu devia ter é arrumado uma mulher que reclamasse menos e ajudasse mais!

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Travesseiro

Ele acorda no meio da noite revirado da asia. Estômago lhe apertando o ventre sobre si mesmo. Anda até a cozinha chutando pedaços duros da escuridão. Escada, cadeira, mesa, pia, armário, um copo... Um copo com água. Mistura com aspirina, com segredos, com confissões e com imaginações. Toma tudo de uma vez. Um gole só. Ele volta pra cama. Dorme visões de vidas sem conflitos. E no sonho ele caminha por uma rua larga. Calçada cheia de gente. Pequena multidão. No meio da multidão, dá de frente consigo mesmo, um clone de si vindo na direção oposta. Olham-se nos olhos. Desviam-se. Seguem em direções opostas. E nunca saem dali.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Hi Kay


Quanta esperança
Olhares se cruzam
A alma dança

sábado, 30 de abril de 2011

Anhangabaú


Aquele espaço todo vazio no meio, calçadão e gramados, e aquelas duas muralhas de prédios dispostos ao lado... Ah, aquilo é a coisa mais linda! Não fosse pelos mendigos espalhados por todos os cantos, as putas empoleiradas às portas de quartos podres e escondidos, que lugar lindo, que lugar lindo! Não fosse pela pobreza que suja tudo de um jeito mais impregnado que a poeira fina da fumaça que essa metrópole faz e refaz todos os dias... Não fosse pelo cheiro de mijo que adensa no ar e invade as narinas pesando no olfato como um paralelepípedo mal cortado pesaria ao tato, que lugar lindo, que lugar lindo... O Teatro Municipal, as belas pontes antigas que cortam o centro. Não fosse a carcaça de cachorro morto jogada assim tão à vista de quem seja a passar, que lugar lindo!

sábado, 23 de abril de 2011

Princesa Isabel


- Ô motorista, vai descê, vai descê!!!

Não era um passageiro gritando, era a cobradora! Magrinha, séria, cansada e revoltada. Seu uniforme de camisa azul e calça azul marinho. E seu olhar sério, sem saber como se desculpar com os passageiros. O ônibus lotado, não havia espaço para nada. Ofereceram-se para segurar minha mochila, já que eu ia em pé com ela pendurada ao braço. Mas não havia espaço para a complicada manobra de tirá-la do meu braço e transferí-la à gentil senhora.

Não bastasse o ônibus lotado, o calor e o excesso de pessoas amontoadas, aquele motorista dirigia como se para torturar um por um dos que estavam ali dentro, como se para maximizar os trancos de cada um dos infinitos buracos das ruas. Como se para lembrar que estávamos em uma carroça, que éramos um rebanho e só. Um rebanho mal tratado, desprezado, cuspido pelo descaso dos altos escalões.

O que se passava com o motorista? Problemas em família? Com sua vida amorosa? Tristeza com a vida? Revolta? Ou indiferença pura e simples? No conforto do assento do motorista talvez dirigir assim fosse muito mais emocionante do que esgueirar-se lentamente pelos entraves dos asfaltos e esquinas.

E as pessoas todas ali, desconhecidas, grudadas, acotovelando-se sem poder impedir. Cheirando-se sem poder evitar. E quietas, torcendo pra acabar logo. Fingindo que é a última vez.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Lábios


Nos olhávamos pensando vez ou outra em como seria bom, mas sabíamos de todas as culpas que nos apertavam pelo pescoço, que nos ameaçavam com rifles. As culpas não são nada simpáticas, não entendem nada dessas coisas de momento. Decidimos ignorar a culpa. Eu queria tirar aquela blusa branca, beijar aqueles seios, mas não havia tempo para tanto... era rápido. Nossos corpos precisavam se sentir pesados um contra o outro. Nossos lábios precisavam tentar se fundir. E depois nada teria acontecido. Depois nos entregaríamos impunes ao prazer infinito de sonhar com impossíveis repetições desse crime irresistível.

sábado, 16 de abril de 2011

Constatação


Há uma coisa melhor do que estar apaixonado: o apaixonar-se.

Todo o universo


As calças ficaram jogadas no pé da cama. A camisa sei lá onde foi parar. Liguei o computador e procurei meu fone de ouvido submerso em bagunças tão impossíveis quanto inevitáveis. O som de um violão bem dedilhado e uma voz que percorre de graves a agudos em uma empostação firme, e eu nem sei se a palavra existe, mas é isso que minha professora de canto sempre dizia. Empostação. A firmeza da voz. Atitude, confiança. Está tudo lá, codificado nos sons. Meus ouvidos vão se enchendo deste leite da alma, é isso que a música é: leite para a alma, o concentrado dos nutrientes necessários para sentimentos bons.

Um coro. Bateria, ritmo. Cadências. Dinâmica... os sons se aquietam, são os músicos todos esperando para me ouvir um pouco também. É a orquestra toda esperando para que eu me escute, perceba em meus vazios de dentro os ecos da vida. E depois volta a altura dos sons todos. Não sei porque é tão bom assim ouvir música jogado num canto de um quarto escuro. Como se não houvesse nada mais no universo e de repente isso tudo é o universo. É uma espécie de loucura, essa força de esquecer o resto do mundo? Ou é a salvação da sensatez esse momento de lembrar com tanto ímpeto dos movimentos de que minha alma é capaz? Um pouco dos dois, por fim. A verdade da vida é insuportável demais para as mentes que são apenas sãs.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Trabalho pela frente

Há algo na liberdade de escrever que é intimamente conectado à liberdade da vida, de modo mais amplo, mais geral. Esse algo anda perdido, não sei bem aonde foi parar. Talvez eu tenha deixado em algum canto bagunçado no meu quarto. Há, ultimamente, muitos cantos bagunçados no meu quarto. Talvez tenha sido a rotina, com sua previsibilidade nunca inspirada e totalmente não inspiradora, que derreteu meus pensamentos até o ponto em que só se sente fácil pensar o que já foi pensado antes. Pensamentos novos andam proibidos. Vai que não agradam. Já pensou, ter pensamentos que não agradam? Sai de mim!

Estive lendo minhas páginas velhas, empoeiradas. Senti uma saudade dos dias passados. Um ano, dois anos atrás. Algo em mim estava melhor do que está agora. Não sei dizer bem o que é mas desconfio que o leitor saberá do que estou falando. Mudamos, sempre mudamos. Há momentos na vida em que sentimos um profundo orgulho de nosso momento presente. Há outros momentos em que o presente parece nos engolir. Aí olhamos para o passado e vem esse saudosismo entorpecente. Olhamos para o futuro e fica fácil, bem fácil, se perder em sonhos e imaginações bem diversos.

Eu vou me afogar em clichês, não tem jeito: o momento é de desafios, de aprendizado, demanda serenidade, preciso de confiança em mim mesmo.

Blá.

O discurso chega a ser tão chato que a tentação recai mesmo para soluções menos ortodoxas: deixa rolar, vamos ver no que dá. Hora de arrumar outras distrações para que essas esferas da vida que tanto perturbam se desgastem pela falta de atenção e aí de repente os problemas mudam de figura.

Do que diabos eu estou falando?

Eu sei lá! Emprego, vida amorosa, carreira, família.

São sempre os mesmos temas de sempre.

Que ser humano, na face deste redondinho pedregulho flutuante, teve já a competência de arrumar um tema genuinamente diferente? Religião? O futuro da humanidade? Um impasse cinetífico?

Sei lá, no fundo não somos tão criativos assim.

O que é bom. É nossa pieguice que cria gênios. Li o Caim, de Saramago. E li críticas diversas de religiosos e outros nem tantos. Muita gente gostou, claro. E muitas muitas outras odiaram. De repente Saramago narra uma cena de êxtase sexual. E um pessoal fica abismado, horrorizado. Acha um jeito de criticar: a narrativa não foi literária como seria cabível a um autor-nobel. O conhecimento bíblico do Saramago é pífio e amadoresco.

Pieguice que estabelece padrões e se amarra a eles.

Talvez um dia eu vire escritor ou qualquer coisa parecida. Mas que Alá me proteja, que os céus conspirem, que Deus me acuda... e que não me deixem, de jeito nenhum, virar uma espécie de crítico mal-almado.

Há aqui na minha escrivaninha um formulário com exatas quarenta e sete linhas. Preciso preencher o formulário. Doze linhas já estão preenchidas. São quase três da tarde. Vou até o banco, há uma conta por pagar. Fatura do telefone. Pagar por internet? Nem morto! Quem confia nessa tal de internet? Até eu escrevo o que quiser na internet, não dá pra confiar.

Falta um tipo de liberdade no meu momento presente e preciso sair para procurar. Depois de pagar as contas, quem sabe?