Um fio de um prédio a outro. E o equilibrista andando lá em cima. E as pessoas se perguntando: pra que tudo isso?
As pessoas não se dão conta da cadeia de valores da vida. Entendem que utilidade é servir a algo mas não extrapolam o raciocínio. Se trabalhar serve para ganhar dinheiro, e ganhar dinheiro serve para poder comprar roupas, e comprar roupas serve para estar bem apresentável, e estar bem apresentável serve para manter um bom lugar à sociedade, e... ... se a utilidade de cada coisa é determinada por uma coisa seguinte então verdadeiramente útil será aquela coisa com caráter de ponto final. Aquela coisa que não serve para nada. O motivo final de algo realmente importante deve ser "porque eu gosto" ou "porque eu quis". Nada pode ser mais fundamental do que isso. Só assim se chega ao outro lado.
sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017
A travessia
Não existe coisa mais difícil do que o amor
Você pode ser a pessoa mais easy going do mundo. Mais tranquila. Mas caso tenha se permitido amar, então de um modo ou de outro, vai doer. Em algum momento vai doer. Ciúme. Ansiedade. Insegurança. Expectativa. Alguma coisa vai doer. Isso se não vier uma grande decepção. Ou então, tragédia irônica, a dor de deixar de amar. Porque... acontece. Ninguém sabe exatamente a razão. Assim como, ainda bem, ninguém consegue explicar exatamente a natureza do amor. Mas esta situação limite acaba sendo a grande força deste sentimento. Com frequência o conforto será destruído em seus alicerces. Neste terremoto da alma, profundas estruturas serão reveladas. Belezas escondidas transparecerão. Outras serão soterradas. Geologia natural. O importante, fundamento mesmo da vida, é não continuar a ser o que se era antes.
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017
Vício em postergar
Pensei em escrever este texto sobre minha tendência à postergação tem já uns três anos.
Finalmente comecei. Logo mais eu continuo.
Hora de viajar
"Meu pai tem razão. Não dá mais pra ficar neste país de merda. Aqui está tudo errado. Esses petistas mamando nas tetas do governo. Bolsa pra tudo. E o emprego indo embora. Esse país deveria valorizar gente que trabalha. Gente que dá duro. Por isso eu vou fazer o que vagabundo não quer. Eu vou trabalhar. Vou para fora do país, estudar e trabalhar fora. É um programa de intercâmbio. Um tempo estudando e um tempo trabalhando. Aprimorar o idioma. Porque não dá pra crescer na vida só falando essa língua de pobre. Tem que ter o inglês. Depois quero falar francês também. Francês é chique, sabe? Pensa naquelas cantoras francesas, coisa mais fina. Queria ser igual elas... Sabe, estava vendo na internet onde vou morar. É um bairro bom. Posso andar em segurança. Talvez eu arrume um cachorro. Passear com ele pelas tardes. Dá pra andar de bicicleta também."
Meritocracia. O mérito de ter um pai que paga seus estudos no exterior.
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017
Por que eu gosto de tirar fotos
-Por que você gosta de tirar fotos?
-Acho que há várias razões. A criatividade. Cada foto é uma produção nova. Esse desafio. Essa coisa da descoberta. A questão do momento decisivo... As fotos têm sempre um momento único. Ou uma foto é feita em um dado momento ou então a realidade já mudou, já era.
-Isso não vale para tudo.
-Não, não vale, mas é meu tipo de foto preferido.
-De pessoas ou coisas?
-Gosto mais de fotos de pessoas. De animais, seres vivos. Coisas que capturem um sentimento. Um momento especial.
-Então é a captura do momento o que interessa?
-Não. Não é verdade. Pois os momentos estão sempre se sucedendo e não há desespero por registrar todos eles. Mas há algo que aprendi com a fotografia e que, quando extrapolamos para a vida como um todo, deixa tudo mais interessante, inclusive os momentos.
-O que é?
-O poder de observar algo em busca de sua porção bela. Mais do que sua porção bela... do modo certo de olhar para algo de forma a lhe encontrar a beleza escondida. É por isso que eu gosto de fotografia. Porque é um treino para o que quero fazer com toda a minha vida: encontrar e destacar as partes belas.
Contagem regressiva
Penso naquela clássica cena com as cores um tanto quanto desbotadas, filmagem antiga ainda para a TV a antena (antena?!). O foguete na plataforma de lançamento. E os números começam a recuar. Dez... nove... oito. Quando finalmente chega o zero, algo espetacular acontece. Uma nave decola rumo ao espaço. Ao infinito. A um outro planeta. Novas descobertas. Novos desafios. Uma grande aventura. Uma mudança radical.
Contagem regressiva.
terça-feira, 21 de fevereiro de 2017
Fotos de despedida
Foi bom ficar atrás das lentes. A concentração no trabalho de fotografar me distraiu das verdades que aconteciam ali. Treze anos frequentando o mesmo lugar. Trabalhando ao lado daquelas pessoas. Muitas vezes viajamos juntos. Agora era a despedida. Um bolo. Salgadinhos. Refrigerante e chocolates. Mas não pensei em nada disso. Pensava apenas em enquadrar as pessoas sem cortar partes de rosto, cabeça ou braços. Porque foi assim o tempo todo: concentrado em cada trabalho que tive que fazer ali, nem vi o tempo passar.
O tempo e o ritmo
Há toda essa onda de relaxar. Levar a vida num ritmo adequado. Fazer as coisas sem desespero. É uma ideia muito cativante. Mas há um problema com ela. O tempo não é infinito. Posso estudar lentamente, sem pressa, fazendo dezenas de exercícios sequenciais. Mas um dia vou morrer. Então, até onde terei ido? Posso ficar em casa lendo livros. Mas poderia estar lá fora conversando com as pessoas. Posso estar lá fora conversando com as pessoas. Mas nem todos os livros serão lidos. Angústia. Dimensão inabraçável da vida.
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017
Literaturização dos livros chatos
Era um livro de meteorologia. Um livro que só serve para aulas chatas. Mas de repente ele foi lido em tom teatral. Dramático. Uma brincadeira, um novo hobby. Trocarem leitura de textos. E também um resumo de um grande objetivo de vida: encontrar a graça mesmo nas coisas mais chatas.
Hora de se assumir
- Você precisa assumir o que você sente.
Daí eu assumo o que eu sinto e a pessoa se revolta.
Mas passa.
De qualquer modo, não é o processo de um dia, ou de um momento.
Porque eu sinto muitas coisas.
E não assumimos uma porção de coisas de uma hora pra outra. Ou com um bilhete. Ou um post na internet.
E, além do mais, assumir o que eu sinto envolve medos. E se ela fugir? E se as pessoas rirem? E se não der certo?