sábado, 24 de fevereiro de 2018

Desarmados para o debate


Discussões sobre temas importantes como a política armamentista de um país deveriam ter duas dimensões: uma primeira dimensão, objetiva e uma segunda constituída de opiniões, preferências e valores pessoais. Na dimensão objetiva teríamos os fatos. Números, estatísticas para além de qualquer discussão e mesmo algumas implicações que vão além de qualquer disputa. E só então entraríamos em uma esfera de valores e preferências. Infelizmente não é assim que o debate se processa. Quando a discussão está em marcha, o que vejo é que efetivamente cada lado do debate está enxergando um mundo completamente diferente do outro. Diferente inclusive quanto aos dados objetivos. Um lado da discussão acha que nos Estados Unidos as armas resolvem o problema da segurança. E temos, claro, pessoas que acham que os EUA erram ao possuírem tantas armas quanto possuem. Mas existem dados para isso. É possível olhar as estatísticas de cada Estado. É possível conhecer o número de mortes associadas a armas de fogo. É possível fazer comparações entre países. É possível produzir um debate realmente rico olhando o mundo como ele realmente é. E, infelizmente, parece que as pessoas estão cegas aos dados.

Essa cegueira, por si só, tem dois aspectos. O aspecto da ignorância/arrogância e o aspecto da inaptidão técnica. A ignorância/arrogância está em não conhecer a informação, e acrescento a barra-arrogância porque muitas vezes as pessoas assumem que uma determinada informação é falsa quando esta lhes é apresentada simplesmente porque vai contra o que “já sabem” que é verdade. Para o bem ou para o mal, esta é uma característica humana e é muito difícil ir contra este instinto. Requer treino. E o segundo aspecto, o da inaptidão técnica, refere-se ao treinamento formal que é necessário para poder discutir números referentes a dados sociais. Compreender a diferença entre números absolutos e números per capita. Compreender o que são ajustes de algumas estatísticas com base na distribuição estária de diferentes populações. Compreender a diferença entre uma correlação estatística e uma comprovação de causalidade. A sociedade como um todo é absolutamente despreparada para uma ampla discussão nesse nível.

Minha própria opinião? Todo esforço é válido para promover um maior esclarecimento ao debate. Mas tenho, pessoalmente, me tornado mais e mais cético quanto à possibilidade de a geração atual aprender a compreender o mundo como precisa para chegar a boas decisões. Se há alguma esperança para a humanidade encontrar seus bons caminhos, acredito, essa esperança está nas próximas gerações. É nos jovens e crianças que devemos nos concentrar se quisermos ensinar todas as complicadas ferramentas de pensamento necessárias a compreender o mundo de modo a promover boas decisões. Os adultos atuais não tem mais tempo para ler, refletir e aprender tudo o que é necessário e, além disso, neles o aspecto de preconceito quanto às opiniões adquiridas já está solidificado demais. Os adultos não são apenas despreparados para um debate de qualidade; são, em geral, refratários a este.

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