terça-feira, 20 de abril de 2021
Desespero
Eu fui ali até a vida, me acheguei de jeito pra espiá o que se acontecia. E se acontecia muita coisa, ô! O homem da mesa empapelada ia nos países todos petroleando dinheiros, a deusa do vestido branco vozeava paraísos nos corações de públicos e câmeras: lentes e olhos choravam todos naqueles agudos suaves de deixar escorregar tristezas pra longe. Naquele mundo mágico até eu tinha um passado e sonhos e futuros e todos estavam ali juntos na mesa do bar rindo de suas mentiras deslavadas, de seus devaneios tolos. Não sabia quanto tempo eu poderia ficar ali olhando, curiosando coisas alheias, os segredos do mundo e de mim e de todos. E nem lembrava bem nas precisões da memória o lugar certo pra onde voltar. Voltar numa imaginária inconsciência do fluxo das coisas onde eu via menos e vivia mais sem saber nos detalhes o quanto da vida acontecia. Ali no mundo fantástico eu era um assombro: um fantasma que tudo via e nada tocava. E me sentia vivo. E de volta à vida, ao mergulhar em minha própria realidade de novo, eu sabia: viveria uma vida plena e, preso para sempre em uma vida só, me sentiria menos vivo. E vi a vida de perto, a vida dos outros. Dos felizes e dos sofredores, dos que fomeavam sem lembranças do último saciar, das brigas de almas desencontradas, das solidões tropeçadas em desejos tão tenros. E de algum jeito, dentro de mim, era ser preso demais ser condenado a uma vida só dentro de um universo tão rico. Inveja de Deus? Pequenez de si? Já se sentiu assim?
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