sábado, 28 de dezembro de 2019

As alianças

Faz tempo e ainda dói lembrar. Isso significa que isso ainda me fere? Ou lembrar de coisas assim é sempre dolorido, mesmo depois de superarmos tudo que há pra superar? Até onde devemos superar um fato para nos fazermos fortes sem ainda nos tornarmos frios?

Ela estava comigo no shopping, e entramos em uma loja de produtos asiáticos diversos. Loja de mulher. Na vitrine do balcão, várias alianças. Uma a agradou demais, demais. Uma com duas argolas, em que a argola de fora girava.

"Olha, aliança de giro-giro!", dizia com uma alegria infantil, olhos brilhando.

Eu tinha apenas minha primeira bolsa na faculdade, para pesquisa. Meros duzentos e oitenta reais por mês. Dava pro ônibus, pra comer, e já faltava.

Mas eu não guardava moedas. Tinha uma caixinha, envolta com fitas durex, e nela colocava minhas moedas.

Levei a caixinha na loja. Lá tinha dinheiro suficiente, os quase noventa reais. Tudo em moedas. Eu já tinha levado as moedas separadas, pra facilitar a contagem.

Mas, para minha surpresa, aquilo não foi apenas uma negociação. A dona da loja ficou impressionada. Ao ver a cena, ela teve a certeza de que eu era muito, muito pobre, e que aquele era o único meio de pagar as alianças, e achou aquilo a coisa mais romântica que já tinha visto. Correu e foi buscar a filmadora.

Comprei as alianças. As alianças e uma caixinha de madeira para enfeitar a surpresa.

E no dia em que eu estava com as alianças no bolso, na casa dela, ela me contou: não havia deixado de amar o ex-namorado e iria voltar pra ele.

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