segunda-feira, 23 de junho de 2008

Quase onze

Eu não era mais quem sou, e sou nada do que nunca seria, sou o oposto das minhas negações do mundo, sou o discurso desmentido desmentindo. Sou uma mentira, uma mentira enoorme. Sou um mergulho em verdades verdades só minhas de ninguém mais.

Dançam em círculos como dois amantes enlouquecidos, num beco abandonado, sob a luz da última lâmpada. Dão-se as mãos e giram, giram e giram... Ele, Impulsivo, ela Cautela. E dançam passos estranhos. Passos imprevistos. Um pensa, o outro fala, um cala e assim vão hesitando entre um ser e outro de si, entre uma possibilidade e outra...

Enterrei algumas espontaneidades debaixo de terra alta, dura e pesada. Outras escapam como água por entre os dedos, fogem ao mundo e lá vivem pra sempre.

Nesses dias de tanto em tão pouco tempo, deito no trilho do trem e fico pensando nas descontinuidades da vida. Deitado no trilho do trem olho as estrelas, e escuto festas ao longe. O trem vem, o trem passa. E no meio de todo aquele barulho e daquela vibração que por instantes parece ocupar todo o universo de forma homogênea, entendo que o suceder de descontinuidades é a própria impressão digital da única continuidade que existe. Essa sucessão criações vindas de si, autopoiéticas em suas entranhas.

Falo às vezes sem pensar. Penso às vezes sem falar. Por vezes palavras doces. Noutras lanças pontudas. E sou sempre eu. Sou assim, muitos, muitos como todos são. Como você é muitos.

Deitado no trilho do trem, olho as estrelas. O universo me olha. Sabe de tudo o que fiz. Sabe de tudo o que sou.

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