quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Alicerce

Acordei com uma certa sensação eufórica. Não entendi bem o que era. Revirei-me na cama, olhei para o teto, para o quarto iluminado pelo sol. Levantei-me, curioso... olhei janela afora e entendi: estava tudo resolvido. Finalmente, eu tinha uma vida sem mais problemas. Vi a cerca branca em volta da casa, devidamente pintada. Cachorros correndo no quintal e minha filha brincando com eles, ainda de pijama. Cena das mais tenras.

No trabalho, não havia mais preocupações. Meu chefe me tratava bem desde então. Nenhum problema com prazos, inimizades. No mundo, a poluição não acontecia mais. A pobreza ilustrava os livros e ocupava as escolas: tão abstrata quanto a matemática.

O mundo foi assim por dois dias. E então alastrou-se a peste. A depressão e a desmotivação disseminaram-se como um vírus mortal. Não se sabe ao certo a extensão dos prejuízos e das inatividades pois nem os estatísticos e os jornalistas, num primeiro momento, julgaram de algum valor contabilizar o que ocorria.

Acordei com uma certa sensação eufórica. Havia sido um sonho? Um sonho apenas? Aquele acordar era estranhamente melancólico e doce: saí do único mundo onde os sonhos máximos haviam uma única vez ao menos se realizado, mas senti-me como nunca necessário ao meu mundo, parte dele como se é parte do que se é um só. Meus filhos estavam brigando na sala porque o temperamento explosivo e inquieto do mais novo atrapalha profundamente todas as brincadeiras de minha mais velha. E minha esposa resmungava maldições a mim por estar em pleno sábado dormindo até tão tarde. Me fingi dormindo por mais três minutos digerindo aquelas esbravejações e então levantei, revigorado como nunca.

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