quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Manifesto contra os dias jogados fora

A humanidade já fez revoluções pelo petróleo. Pelo ouro. Para defender suas terras. E continuamos perdendo nosso bem mais sagrado e fundamental sem perceber. Nosso tempo. Essa entidade abstrata que não pode ser colocada em containers e escapa a um controle rígido do governo: o tempo continua fluindo a uma taxa constante. Mas o tempo psicológico, o tempo da nossa existência, esse é sim engolido e devorado pela vida moderna. O tempo no trânsito. O tempo em que estamos rendidos ao cansaço. Os filhos lá brincando, lendo histórias, você lá em estilhaços sobre o sofá sem entender o que se passa ao redor. Estaria mais consciente da vida se estivesse em coma em uma UTI.
Por isso estou escrevendo este manifesto contra os dias jogados fora. Um espectro ronda os trabalhadores do mundo. E os vagabundos. E os boêmios. E os ricos: o desperdício dos dias. É um recurso valioso que vai embora para nunca mais voltar. Os dias se perdem quando você se rende ao sofá. Às reprises de série. O tempo se perde quando você se alimenta mal e joga seu corpo na lata do lixo da preguiça. O tempo é aniquilado quando você deixa para ligar para aquele seu amigo ou amiga depois.
Precisamos lutar como gladiadores para salvar nosso tempo. Colocar energia nessa missão. Escrever de tempos em tempos para nossos queridos. Um e-mail, uma mensagem de whatsapp ou, quem sabe, uma carta no papel e caneta, colocada no correio. Precisamos fazer uma caminhada. Às vezes sozinhos, às vezes acompanhados. Precisamos de tempo para aquelas coisas de que gostamos. Nossos projetos pessoais. Seja brincar com o cachorro, ensinar tabuada para o filho ou pintar bugigangas de artesanato. Todas as categorias são válidas desde que estejam conectadas ao seu coração. Se sua grande paixão é ler livros de administração, ou pintar suas unhas ou trocar de piercing, não importa... mergulhe em suas paixões sem medo. Recupere o tempo que está se esvaindo pelos ralos.
E não caia na armadilha do desespero pela eficiência. Coisa que os americanos inventaram para transformar uma causa justa em neurose (coisa em que eles, aliás, são muito bons). Usar bem o tempo signifia que quando o que você quiser fazer for precisamente não fazer nada, precisa fazer isso direito. Nada de celular, televisão, distrações... Encontre seu refúgio de paz e seja um fazedor de nada digno de louvor. Há também aí toda uma arte escondida.
Estamos em uma civilização que decidiu se jogar no lixo. Destruir rios, deturpar a economia, se mutilar em guerras e cultivar a ignorância. Nosso último reduto de salvação é nossa existência interior. E o terreno que essa existência ocupa é o terreno do tempo. É por aí que devemos começar a nos proteger e daí que devemos iniciar nossa revolução se for para, algum dia, ter condições de voltarmos a brigar pelo resto.

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