sábado, 14 de outubro de 2017

Projetos de vida

Eu queria ser astronauta. Mas eu não sabia que minha preguiça em correr e andar de bicicleta e aprender inglês e estudar aquelas coisas complicadas de química orgânica iriam, em conjunto, configurar um grande impedimento. Também não tinha a noção de que havia nascido no país errado. Ainda que possível ser astronauta enquanto Brasileiro, enquanto escrevo as chances de sucesso para essa categoria são de cerca de de 1 para 200 milhões (0,000000005). Depois eu quis ser sociólogo. E quem sabe me tornar um político e atuar pela melhoria da educação. Mas eu não sabia que minha aversão a me misturar com as pessoas do centro acadêmico seriam um grande impedimento. Eu não sabia que me concentrar em estudar e ter boas notas não saria suficiente. E não estava preparado para um pânico que, por esta época, tomou conta até dos meus ossos: onde é que eu iria ganhar dinheiro?
Depois eu quis ser um engenheiro. Fiquei no básico: arrumei um diploma e um emprego com uma mesa e um computador. Mas faltavam coisas. Uma ambinção empreendedora que me motivasse a correr atrás do dinheiro. Eu ficava encantado demais com complicados modelos matemáticos e gráficos exóticos enquanto a carreira, fui descobrir depois, não saia do lugar. Fiquei depressivo.
Aí decidi ser piloto. Coisa com que eu flertava desde criança. Coisa que me levaria de volta a esse meio mágico e maravilhoso. Mas eu já estava ficando velho. "Moleques" dez anos mais velhos que eu já estavam com todos os brevês na mão e conseguindo seus empregos nas grandes companhias aéreas. Quem iria querer um engenheiro já algo barrigudo como novato copiloto? E eu não estava preparado para o bairrismo dos instrutores de voo que não me davam oportunidade porque, bem, eu era um cara de fora. Não era da cidade deles. E era um forasteiro cheio de diplomas e títulos nerds... O que eu estava fazendo ali? Briguei e me desgastei mas isso de nada adianta.
Isso sem contar as outras iniciativas, menos oficiais, que também não deram em nada. Fotógrafo de festas. Professor de inglês. Tradutor de trabalhos escolares. Guia para estrangeiros. Clarinetista em barzinhos. Cantor de bandas amadoras. Blogueiro de assuntos aleatórios. Historiador. Cientista de sistemas complexos. Uma infinidade de áreas exóticas às quais me dediquei por um tempo só para, no meio das complicações da vida, perceber que a correnteza havia mudado antes que eu pudesse me amarrar firmemente a algum atracadouro.
Até que, tempos atrás, descobri algo que eu comecei lá na infância e que nunca parei de praticar. Escrevo. Escrevo contando meus dias, meus namoros, minhas engenharias, minha aviação. Escrevo contando meus sucessos, meus fracassos, meus pensamentos, minhas dores. Escrevo praticando ser essa coisa que, ainda que falhe, não deixará de ter seu sucesso, porque se provou inescapável em minha vida. Descobri que não coleciono diversos projetos de vida que falharam. Descobri que estou fazendo exatamente o que um escritor deve fazer: explorando o máximo do mundo que posso.

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