Eu namorava a Aline. Toda sexta-feira eu ia para o apartamento dela. A Aline era aventureira. Gostava de viajar. De sair. De conhecer lugares. E andava com uma Scooter vermelha. Tinha essa pequena moto super feminina, com enfeites coloridos, flores, borboletas no baú.
Era uma sexta-feira quente. Com aquele asfalto que parece soltar vapor, tremulando as imagens próximas com seu ar cálido. O trânsito parado. Vi que era um acidente ali na frente. Xinguei o trânsito. A gente sempre xinga o trânsito. Aí eu vi que era um acidente com uma moto. E pensei em tudo o que eu lhe diria depois, sobre os perigos de você ficar andando de moto por aí. E depois vi que era um acidente com uma scooter vermelha. Mas não era você. Claro que não era. São tantas scooters vermelhas na cidade. Mas aí vi aquele cabelo loiro sob o capacete vermelho. Os cachos. Vi o sapato roxo. O sapato roxo que você tanto adorou. E o baú todo colorido, enfeitado.
Corri no meio do trânsito sem ver direito por onde estava pisando, por onde estava passando. Não sei como não fui, eu mesmo, atropelado ali por uma moto. O carro de resgate já estava ali, e você estava tremendo. O corpo em choque. O que tinha acontecido afinal?
Demorei para entender que não era ela. Os enfeites no baú eram outros. O sapato era roxo também e eu nunca vou saber explicar as diferenças estéticas entre aquele sapato e o dela. Mas posso jurar que a cor era a mesma. E o cabelo era loiro também. Depois que eu vi similaridades suficientes, o surto de desespero tomou conta de mim. Queria tirá-la dali. Queria voltar o tempo. Queria impedir aquilo tudo.
Naquele dia eu chorei na cozinha, contando a ela a história. Eu não conseguia terminar a frase. Achei por um segundo que tinha te perdido. Eu não conseguia dizer. Achei que tinha te... E soluçava.
Ela achou lindo. Me viu apaixonado. Desesperado por não perdê-la.
Namoramos felizes por mais alguns meses, até que o relacionamento morreu de uma morte mais natural.
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