-Imagine que você tem a certeza de que o mundo não suporta a humanidade, e que vai haver um colapso do ecossistema, do clima, de suprimentos, e a humanidade vai se dizimar em guerras-civis fazendo o pior do holocausto da segunda guerra parecer um desenho dos ursinhos carinhosos. Imagine que você sabe disso com cem por cento de certeza. E imagine também que você tem o poder de evitar isso, porém essa decisão vai acarretar na eliminação prévia de 75% da humanidade. Você sabe perfeitamente quais pessoas devem ser mortas e quais devem viver. Não importa como você sabe disso; é um pressuposto desse problema que essa certeza existe e não é isso que está em questão. E aí? O que você faz? Dizima bilhões de pessoas para salvar o mundo e tudo o mais, ou deixa a história seguir seu curso e o maior caos já visto no planeta se desenrolar?
-Nesse caso, eu jogaria uma moeda.
-Eu sabia! Deixou a decisão ir para o emocional em detrimento do racional.
-De modo algum!
-Claro que sim! Mesmo sabendo com uma certeza racional, que era hipótese do problema, qual era a escolha boa e a ruim, escolheu jogar uma moeda para não ficar com o ônus da culpa em nenhum dos casos.
-Não é isso! Quem disse que uma das decisões é boa e a outra é ruim? Por isso deixei ao acaso! Ainda que eu tenha, neste cenário, plena certeza quanto ao desenrolar dos dois cenários, não sei o que me garantiria que um dos quadros é bom e que o outro é ruim. Matar 75% da humanidade pode ser bom por salvar o ecossistema e a estrutura social e intelectual da nossa civilização atual. Mas pode ser ruim pelas mortes em si, ou mesmo pelas mesmas razões. Se foi nossa civilização e cultura e tecnologia que deixou tudo chegar ao estágio atual, matar 75% da população para salvar esta estrutura pode significar, apenas, perpetuar o problema. A população voltaria a crescer e os recursos naturais continuariam a ser consumidos e a biodiversidade continuaria sofrendo de nossa voracidade cruel. Já no cenário de deixar a história seguir seu curso e ver a civilização entrar em colapso, a humanidade iria se consumir a si própria em guerras e fome e tragédias. O que talvez arruine toda nossa cultura e possibilite o surgimento, dentre os sobreviventes, de uma cultura mais respeitosa com a escassez, com a natureza. Algo como o Japão, que vive passando por tragédias e tem uma relação mais humana de uns com os outros (ainda que não com os oceanos, porque isso eles sempre tiveram de sobra e então ainda hoje não ligam em matar baleias). Também pode ser algo horrível, bilhões de mortes trágicas e sofridas sem nenhum efeito colateral benéfico para o futuro. O ponto é que, mesmo com as certezas que você deu, essa distinção de valores entre uma escolha e outra não é óbvia e não tenho palpites quanto para um lado ou outro. E, por isso, jogaria a moeda.
segunda-feira, 30 de março de 2015
A decisão é sua
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